Fotografia tirada no FIG, 2014.
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Feche o buraco ou deixe o recinto.
Todos (todas) falaram, espalharam, tagarelaram sobre a atração famosa da primeira noite, mesmo antes de ser lançada a programação. A última atração, dona Ana xará.
O que me levou (sozinha, na chuva) à praça lotada, no entanto, foi uma senhorita bonita chamada Renata. Sou fã de carteirinha, apesar de não ter acompanhado os trabalhos mais recentes. Sou fã pela música, pelo ideal e pela atitude dessa criatura que sabe que é gente como toda gente.
O que me leva ao ponto principal desta crônica: atitude.
Apesar do meu atraso habitual, cheguei bem antes do show que me interessava (afinal, o atraso é habitual no Brasil inteiro). Afim de ver a senhorita de perto, fui avançando na multidão, cabeça baixa e passo rápido - já estava começando. Ao chegar mais perto da frente, perdi logo as esperanças de ficar na grade, e depois, até mesmo perto dela. Muitas pessoas, muitas pessoas imprensadas. Normal.
Senti logo uma estranheza ao meu redor. Tentei ignorar, afinal podia ser o fato de não ter pessoas conhecidas por perto. Mas as músicas foram se seguindo e a massa de pessoas na grade (até onde minha vista submersa alcançava) falava da vida, se pegava (se pegava bastante), virados, de costas e, finalmente, com sua muralha impenetrável de guarda-chuvas erguida.
Eu, numa dança trôpega de ponta de pés, só queria mesmo ver a senhorita Renata, ouvir a música, e se possível, dançar um pouco nos meus centímetros quadrados.
Só pude mesmo encarar quando, ao ser iniciada a apresentação dos integrantes que a acompanham "há 12, 13, 14 anos", indivíduos da massa da grade, por todos os lados, resolveram levantar as mãos em sinal de não. Gritos de "não" enquanto ela agradecia a oportunidade de voltar à cidade, a presença de tantas pessoas e expressava seu desejo de que aquela energia durasse a noite inteira.
O mesmo se deu em todas as pausas seguintes, culminando na enxurrada de aplausos e assovios quando foi anunciada que a próxima música seria a última do repertório.
Não é necessário dizer que não houve chamada de "mais um".
Não tenho uma conclusão boa a fazer, neste fim de relato, sobre a atitude deste público para com os artistas. Creio que é um direito pessoal gostar ou não de algo, seja lá o que for. Mas há um limite (feito de neón, gliter e luz led) entre ter opinião própria e desrespeitar outra pessoa.
E a mim, sinceramente, não interessa se essas pessoas foram apenas para a festa ou ver dona Ana xará, se não quiseram sair da beira do palco para não ceder o lugar que levaria mais de três horas para "valer à pena", ou se estavam muito bêbadas para lembrarem o que é respeito. Se você escolheu estar na presença de um artista, que está trabalhando e dando tudo de si, você só abre a boca se for para aclamar. Caso contrário, feche o buraco ou deixe o recinto.
Agora só me resta dizer que a senhorita bonita Renata Rosa estava maravilhosa, linda, dançando e trajando seu sorriso satisfeito o tempo inteiro. E agradeço infinitamente que, do alto do palco luminoso, havia uma praça lotada, mesmo na chuva, gritando e aplaudindo.